Sei que não cresci onde deveria ter crescido. Talvez seja de um tamanho que não cabe em todo o lado. Talvez seja grande demais, ou pequena, ou apenas diferente. O meu coração não me cabe no peito. Talvez seja isso, então! Talvez o meu coração tenha crescido dentro de mim em lugar de ter crescido por fora. Mas somos demasiado um do outro para que possamos crescer sozinhos. Não sei quem depende de quem, ou se somos apenas como um só.
Esta não é a minha história. Se fosse, eu não estaria aqui, sentada na cadeira de um café qualquer perto de casa. Esta é a história do meu coração, que é como um todo mas pertence-me só a mim. Espero que a ouças e que percebas as minhas palavras, porque não sei traduzir melhor o meu coração, apesar de ele se fazer ouvir tão bem! Se o pudesse fazer de forma diferente, talvez te tocasse com as minhas mãos e deixasse que elas falassem por mim aquilo tudo que eu não consigo. Se o pudesse fazer de forma diferente, talvez te cutucasse para chamar a atenção do teu olhar. Talvez te segurasse na mão de forma alguma parecida com a que outra pessoa tivesse segurado. Sei que era capaz de o fazer, se o pudesse…
Não cresci sobre as montanhas, portanto é como se me encontrasse sempre longe de ti. Vejo-as cá debaixo, e a ti vejo-te nas nuvens. Talvez seja por isso que me distraio constantemente quando as observo. Não é que elas não sejam bonitas por si só, mas é, principalmente, porque te encontro lá. Não sei se é o meu coração que te imagina e cria ilusões daquilo que gostaria que fosses. Só sei que te vejo todos os dias, sem exceção. Sem haver sequer exceções que façam a regra, porque quem a dita sou só eu.
Eu sou assim. Teimo em insistir naquilo que me alenta o ritmo do peito. No que me traz memórias que ainda estão por vir, sensações que o meu corpo idealiza, emoções que me passeiam na alma e me fazem ficar agitada enquanto a lua e o sol se encontram pelo céu. De tanto olhar para as montanhas vejo-as com a minha imaginação, talvez obra da vontade do meu coração. Afinal esta história é dele...
Quando os dias estão límpidos posso ver as montanhas. Mas gosto ainda mais de ver-te entre elas e as nuvens. Não é sinal de mau tempo, antes de tempos amenos. E não preciso nem de muito frio nem de muito calor para me sentir sem dúvidas em relação a ti. Se nos entregam outonos e primaveras, juntos fazemos das estações o nosso inverno e o nosso verão: gelamos o ar com a distância que nos separa e aquecemos o sol quando nos encontramos presos um ao outro, sem razão que nos separe e nos supere. Ou pelo menos eu sonho que sim. O meu coração faz o que quer, sempre foi assim.
Subiria às montanhas se pudesse. Aprenderia a escalar, ganharia asas para voar, controlaria a gravidade, e encontrar-te-ia nas nuvens. Só que o meu coração não sabe caminhar sozinho. Se fosse por ele eu não estaria aqui, sentada na cadeira de um café qualquer perto de casa. Mas estou, e se não te abraço, sinto que a culpa será minha. Tento, por fim, imaginar… Ah, mas se bastasse…
Antibes Seen from the Plateau Notre Dame, 1888, Claude Monet. |